26 de Novembro de 2024

Queimadas na Amazônia têm alta de 60% em outubro e governantes culpam seca, vento e Bolsonaro

O número de queimadas registradas na Amazônia bateu recordes no mês de outubro e deflagrou um jogo de empurra e busca por culpados entre a União e governantes do Amazonas e do Pará. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem culpando a seca e seu antecessor, Jair Bolsonaro (PL). Governadores e prefeitos locais atribuem a responsabilidade uns ao outros e ao vento, enquanto ativistas de esquerda dizem que o problema está no El Niño.

O bioma da Amazônia teve 22.061 focos de incêndio em outubro deste ano, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Foram 8.150 casos a mais do que o registrado no mesmo mês do ano anterior, representando uma alta de quase 60%.

Somente o Amazonas teve 3.858 focos de incêndio, o maior número para o mês desde 1998, quando começou a série histórica do Inpe. Já o Pará registrou 11.378 focos de incêndio em outubro. Foi o maior número registrado no nessa época do ano desde 2008, quando 11.568 focos de incêndio foram computados.

Lula vinha acusando Bolsonaro de ser o grande responsável pelas queimadas em seu mandato. Mas, quando o cenário se repetiu em seu governo, o petista decidiu continuar culpando o rival pelo problema. Ele vem afirmando, sem apresentar evidências, que as áreas que estão sendo queimadas agora são fruto de desmatamento feito na gestão passada.

Mas a busca por culpados transcende o PT e partidos de esquerda e passou a envolver governadores e prefeitos. Municípios do Amazonas têm atribuído uns ao outros a responsabilidade sobre uma nuvem de fumaça que está fazendo da capital, Manaus, uma das piores do mundo em qualidade do ar. Enquanto isso, o governo do Amazonas joga a culpa no Pará, que chegou a registrar 5,3 mil focos de incêndio em uma semana.

Governo Lula não tem conseguido cumprir promessas e estados entram na briga 

A origem da nuvem de fumaça que afeta Manaus e do número elevado de queimadas tem criado animosidades na região amazônica. Em meados de outubro, o superintendente do Ibama no Amazonas, Joel Araújo, disse que a densa fumaça que envolvia Manaus tinha origem nos municípios de Careiro e Autazes, no Amazonas. De acordo com Araújo, essa fumaça seria resultado de incêndios causados por agropecuaristas nessas áreas e é transportada para Manaus por meio de massas de ar.

No entanto, na última sexta-feira (3), o governador do Amazonas, Wilson Lima, publicou um vídeo afirmando que a fumaça que cobria a capital tinha origem nas queimadas registradas em municípios do oeste do Pará. A informação foi reforçada por uma informação publicada no site da Secretaria de Meio Ambiente do Amazonas, que utilizou dados do Inpe e imagens de satélite para reafirmar que a culpa da fumaça em Manaus era do estado vizinho.

Enquanto isso, o Ibama já admitiu a falta de estrutura para combate das queimadas na Amazônia. “Obviamente a gente tem de se planejar melhor, ter estruturas melhores”, disse o presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo.

Governo estuda punição para produtores rurais acusados de queimadas na Amazônia

Com ações federais contra a seca no Amazonas somando R$ 628 milhões, o governo Lula tenta “abafar” o que ocorre neste primeiro ano de mandato. O investimento tenta abarcar as promessas audaciosas sobre o meio ambiente relacionadas, por exemplo, à diminuição nas emissões de carbono e à adoção de práticas sustentáveis para a agropecuária, além da atuação para a diminuição das queimadas e do desmatamento que foram feitas na intenção de criar uma boa imagem do país.

Lula investe especialmente nos eventos internacionais para tentar se lançar como uma liderança mundial, como na COP 28, que será realizada em Dubai entre o final de novembro e o começo de dezembro. Isso porque, após apoiar a Rússia na guerra contra a Ucrânia e hesitar em chamar o Hamas de grupo terrorista, Lula só tem a defesa do meio ambiente para apresentar como bandeira e tentar se projetar como liderança mundial.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o governo do Amazonas anunciaram recentemente que estudam uma medida administrativa para punir os produtores rurais que, alegadamente, estariam contribuindo para os incêndios florestais na região. O secretário Extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do MMA, André Lima, e o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, chegaram a mencionar que a medida compreenderia a suspensão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades em que fossem constatados focos de incêndio.

A inscrição no CAR é obrigatória para todos os imóveis rurais do país e constitui-se no primeiro passo para a regularização ambiental prevista em lei. Além disso, as propriedades com o cadastro em dia têm acesso a benefícios previstos no Código Florestal. A suspensão do CAR implica, por exemplo, na impossibilidade de os produtores terem acesso ao crédito, já que o cadastro é pré-requisito para obtenção de financiamento junto às instituições financeiras.

Apesar do anúncio, a medida ainda não foi colocada em prática, ou sequer esclarecida. A Gazeta do Povo entrou em contato com o Ibama, o Ministério do Meio Ambiente e o governo do Amazonas para buscar informações sobre o assunto e, até o momento, não recebeu retorno. O espaço segue aberto para manifestações.

Diante da ausência de esclarecimentos sobre a medida e de outros ataques ao agronegócio, deputados aprovaram um requerimento de convocação da ministra do Ministério do Meio Ambiente, Marina Silva, para prestar esclarecimentos da Câmara dos Deputados.

“É de extrema importância que se esclareça de forma transparente e clara qual é a verdadeira intenção do Ministério do Meio Ambiente ao adotar essa estratégia, bem como quais impactos foram considerados na elaboração da proposta. Isso é fundamental para garantir a confiança da sociedade nas políticas ambientais e agrícolas do Brasil”, afirmaram os autores do requerimento, os deputados Rodolfo Nogueira (PL-MS) e Zé Vitor (PL-MG).

Ativistas e artistas de esquerda dizem agora que queimadas são culpa do El Niño

Em anos anteriores, quando os registros de queimadas também tiveram números elevados, artistas nacionais e internacionais promoveram mobilizações na internet e nas ruas. A ativista sueca Greta Thunberg e o ator americano Leonardo Di Caprio, por exemplo, se manifestaram algumas vezes sobre o fato entre 2019 e 2022.

Di Caprio criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro, em publicação feita em 2020, pela atuação diante das queimadas. Já em 2023, ele divulgou dados sobre uma queda no desmatamento, elogiando Lula pela atuação nessa sentido e na demarcação de terras indígenas.

Desde o início do período de queimadas na Amazônia, em julho, até o momento, o Brasil somente foi mencionado nas redes sociais de Greta em uma publicação. O texto, que não é de sua autoria, foi compartilhado em 20 de setembro e falava sobre a possibilidade de o país registrar sua temperatura mais alta da história durante uma onda de calor. Apesar do silêncio sobre as queimadas no Brasil, incêndios florestais na Itália e no norte da África, por exemplo, foram compartilhados pela ativista.

Artistas brasileiros críticos ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, que chegaram a fazer manifestações nas ruas, atribuindo as queimadas na Amazônia à má gestão, agora se ancoram no discurso das mudanças climáticas e atribuem a situação aos efeitos do fenômeno El Niño. É o caso de atrizes como Alinne Moraes e Maria Paula, que participaram de protesto contra as queimadas em 2019, no Rio de Janeiro, mas que até agora não têm se manifestado.

O ator Sergio Marone chegou a gravar vídeo sobre a seca e as queimadas, mas sem adotar um tom crítico ao governo. “A seca na Amazônia é preocupante e resultado da junção de anos de desmatamento + El Niño + Crise Climática”, escreveu o ator.

Dados do governo sobre desmatamento

Apesar dos números recordes de queimadas na Amazônia em outubro, o governo federal organizou uma coletiva para dizer que houve queda no desmatamento entre agosto de 2022 e julho de 2023. O Ministério do Meio Ambiente afirmou nesta quinta-feira (9) que o desmatamento na Amazônia caiu 22,3% no período citado. Segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foram desmatados no bioma 9.001 km².

Novamente, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi citado pela atual gestão como um dos responsáveis pela situação. Durante o evento para a apresentação dos dados, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que o governo Lula pegou “um passivo de 6 mil quilômetros [quadrados de área desmatada] do governo Bolsonaro que estará sendo computado para o desmatamento de 2023”. Mesmo assim, segundo ela, o governo conseguiu “uma redução de 42% [neste ano] graças às ações emergenciais dentro do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia”.

 

Informações da Gazeta do Povo / Foto: Raphael Alves/Agência EFE

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