Para criminalistas, não há requisitos para Moraes prender Bolsonaro no caso das joias
A pressão ou o desejo de parte da sociedade, da imprensa e da esquerda para prender o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), devido ao caso das joias, não são motivos para uma medida drástica desse tipo. E esse cenário deveria exigir cautela do ministro Alexandre de Moraes. Ao contrário, espera-se que ele apenas examine se os fatos até agora provados se encaixam nos requisitos previstos em lei, e nos entendimentos mais recentes do Supremo Tribunal Federal (STF), para decretar uma eventual prisão preventiva.
Essa é a visão de dois criminalistas consultados pela Gazeta do Povo para saber se há fundamento, hoje, para uma prisão de Bolsonaro. E para os dois, a resposta é negativa.
Para o procurador, ex-deputado e professor Fernando Capez, nenhuma das condições para uma prisão preventiva está presente, com o que se sabe até o momento. “Existe algum risco nesse momento para a ordem pública, a produção da prova e a aplicação da lei penal? Não”, diz ele.
Por razões semelhantes, o advogado e professor Davi Tangerino diz não acreditar numa prisão preventiva no curto prazo. “Não tem nenhum evento contemporâneo, na minha opinião, que justifique uma prisão preventiva. Enquanto não surgir prova de que ele está destruindo provas, coagindo testemunhas ou que vá fugir, não vejo presentes os elementos para a medida”.
Desde a semana passada, cresceram as especulações sobre eventual prisão de Bolsonaro depois que a Polícia Federal realizou operação contra o general Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens Mauro Cid; e o advogado Frederick Wassef. A investigação, conduzida por Alexandre de Moraes, comprovou com fotos e mensagens de celular que Lourena Cid ofertou e vendeu nos Estados Unidos presentes recebidos por Bolsonaro na Presidência, enquanto Wassef recomprou um Rolex para devolvê-lo ao patrimônio público.
Para a PF e o ministro Alexandre de Moraes, há indícios dos crimes de peculato (desvio de bens públicos) e lavagem de dinheiro (pela tentativa de ocultar as transações com dinheiro em espécie e depósito em conta no exterior). A defesa de Bolsonaro, no entanto, sustenta que as joias podiam ser vendidas porque eram privadas, pois eram itens “personalíssimos”.
Ainda que fosse provada uma ordem de Bolsonaro para vender os presentes e receber o dinheiro, e que os itens fossem considerados bens públicos, a prisão preventiva não se justificaria. A lei e a jurisprudência recente do STF exigem que, para sua decretação, haja risco concreto de que, solto, Bolsonaro poderia cometer novos crimes, atrapalhar a investigação ou fugir do país. Uma decisão nesse sentido, portanto, deve demonstrar atos recentes que apontassem para uma ou mais dessas supostas tentativas.
“A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser fundamentada e motivada em existência concreta de fatos novos e contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”, diz o artigo 312 do Código de Processo Penal, em redação aprovada em 2019, no âmbito do chamado pacote anticrime. Até o momento, nada indica isso, na avaliação dos juristas.
Se a investigação verificar que Bolsonaro está tentando algo do tipo, Alexandre de Moraes ainda teria de demonstrar que outras medidas alternativas (monitoramento eletrônico, bloqueio de bens, proibição de contato com outros investigados, por exemplo) não seriam suficientes para impedir danos à ordem pública, à coleta de provas e a eventual punição.
“A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o artigo 319 deste Código e o não cabimento de substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos previstos no caso concreto, de forma individualizada”, diz o artigo do 282 do CPP, com a nova redação aprovada em 2019 no pacote anticrime.
Informações da Gazeta do Povo / Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE
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